África
do Norte
Antes de ser uma região, ela constitui, por si só, uma parte do
continente – a África do Norte – por distinção da outra parte, a África
Subsaariana. Devido à predominância árabe na região e às consequentes
afinidades histórico-culturais e linguísticas ela é separada, em alguns livros,
do resto do continente e agrupada ao estudo do Oriente Médio.
A África do Norte apresenta duas sub-regiões: a leste, o Machrech,
que inclui a Líbia e o Egito e se prolonga, fora do continente, até a Península
Arábica. A oeste, bem mais individualizada, o Magrebe ("onde o sol se
põe", em árabe), que compreende a Tunísia, a Argélia e o Marrocos.
O grande Magrebe é um projeto político e econômico, de longa
maturação, que pretende a integração nele da Líbia, da Mauritânia e do Saara
Ocidental. Este está em processo de plebiscito pela independência ou
incorporação definitiva no Marrocos.
É a região que disputa a primazia geopolítica e econômica com a
África Austral, contudo, no momento, ela apresenta vários indicadores de
desenvolvimento econômico-social e posição estratégica (compartilha com a
Europa e o Oriente Próximo a bacia do Mediterrâneo) que ainda a colocam no
primeiro lugar do ranking africano.
Dos sete países africanos com maior PIB, grau de
industrialização e escolaridade, cinco pertencem à África do Norte: Egito,
Argélia, Marrocos, Líbia e Tunísia. Graças à sua população de mais de 140
milhões de habitantes, a África do Norte tem um número de árabes e de
muçulmanos maior que o Oriente Médio.
O seu lastro cultural indica ser a região mais homogênea do
continente: de modo geral, tem uma só religião, o Islão, uma só língua, o
árabe, e persegue a utopia de uma só nação, a árabe. No entanto, a região tem
uma forte comunidade autóctone, a berbere, especialmente no Marrocos e na
Argélia.
Como lastro histórico, a região possui grandes centros de
irradiação político-cultural. É o caso do Egito Antigo, com a influência negro-sudanesa
que recebeu de Cartago (na atual Tunísia), e do reino do Marrocos, Estado com
mais de mil anos, onde a dinastia alauía, reinante, tem perto de três séculos
de poder.
Porto de partida na invasão moura da Península Ibérica, o
Magrebe serviu de tapete para várias invasões: fenícia, romana, bizantina,
vândala e árabe. Esta produziu uma virada histórica na região, com sua
islamização e a miscigenação com os berberes. Após a implantação árabe veio o
domínio otomano, substituído, no final do século XIX, pela ocupação europeia.
Esta se iniciou pela conquista da Argélia pela França, em 1830.
O perfil político da região é marcado pela presença de Estados
antigos, alguns milenares, que permaneceram como estrutura representativa
durante a colonização, como foi o caso do Egito e do Marrocos, que apresentam
forte coesão nacional. Já a Argélia só obteve essa coesão a partir da guerra de
independência (1954-1962). Os países desta região estiveram entre os primeiros
da África a obter a sua independência (Egito, 1922; Líbia, 1951; Tunísia e
Marrocos, 1956; e Argélia, 1962).
Quanto à colonização, a França dominou no Magrebe. Tunísia e
Marrocos tiveram o estatuto de protetorados. A Argélia era considerada um
departamento da França, na realidade era uma colônia de povoamento, tendo nela
se instalado um milhão de europeus. Houve colonização inglesa no Egito e
italiana na Líbia.
Do ponto de vista demográfico, há uma forte densidade no vale do
Nilo e na faixa costeira da região, que apresenta a mais alta taxa de
urbanização do continente, assim como é a mais industrializada. Três dos seus
países (Argélia, Líbia e Egito) são exportadores de petróleo.
As suas classes dominantes ou são antigas, como a mercantil e a
fundiária, ou, embora de formação recente, como a industrial, são apoiadas no
Estado. A região apresenta – na escala do continente – uma alta taxa escolar e um
funcionalismo de bom nível. Um fenômeno relativamente recente, mas que
constitui um obstáculo ao desenvolvimento e à própria governabilidade é o
fundamentalismo islâmico, presente há mais tempo no Egito, mas, atualmente,
muitíssimo mais intenso na Argélia.
Do ponto de vista das relações
internacionais, todos os cinco países da região estão entre os quinze mais
influentes do continente. Esses cinco países têm relação privilegiada com três
áreas político-culturais: a Europa mediterrânica, sobretudo o Magrebe com a
França (mais de 2 milhões de magrebinos como imigrantes); o Oriente Médio, como
já foi referido, e também com a África Subsaariana, sobre a qual ainda exercem
(menos que nas décadas de 60 a 80), de forma diferenciada, uma sensível influência
política.
África
Ocidental
A região é formada por dezesseis países: Benim, Burkina-Faso,
Cabo Verde, Costa do Marfim, Gâmbia, Gana, Guiné, Guiné-Bissau, Libéria, Mali,
Mauritânia, Níger, Nigéria, Senegal, Serra Leoa e Togo. Treze deles se situam
na costa Atlântica e três (Burkina-Faso, Mali e Níger) não têm saída para o
mar. Estes três, junto com a Mauritânia e o Chade (da África Central), compõem
a sub-região do Sael (Sahel), marcada por uma forte desertificação. É uma das
zonas mais problemáticas da África e foi outrora uma área de contato – comércio
do ouro – entre a África mediterrânica e a tropical. O Sael também representa
uma zona de ligação entre as duas margens do Saara, dos povos arabizados com os
povos negros.
É uma região com importantes focos históricos: do século X ao
século XVI, o reino do Ghana e os impérios do Mali e Songhai, produtores de
ouro; um pouco depois, na atual Nigéria, as cidades-Estados haussa, ao norte, e
as cidades iorubás, no sudoeste. Foi uma área pioneira de tráfico para as
Américas. No início do século XIX vieram escravos iorubás para Salvador,
predominantemente do atual Benim (antigo Daomé), chamados de nagôs. Neste mesmo
século, ex-escravos, africanos e alguns já brasileiros, retornaram para a
Nigéria, o Togo, o Benim e o Gana - são geralmente designados atualmente como
agudás.
A África Ocidental é a região com maior número de países e onde
se encontram os menores Estados, resultado da "balcanização"
colonial. Resulta disso, de certa forma, o predomínio étnico sobre a nova
identidade nacional forjada pelo Estado. Também permanecem marcantes as
estruturas político-sociais tradicionais.
A colonização foi feita através de uma competição secular entre
a França e a Inglaterra, embora em todo o processo de ocupação do continente
não tivesse havido nenhum conflito militar entre as potências europeias;
predominou a negociação entre elas face aos africanos. Foram colônias inglesas
Serra Leoa, Gana, Gâmbia e Nigéria. Ao contrário do que aconteceu com as
colônias de povoamento europeu na África Austral e Oriental, a Inglaterra
praticou na região uma colonização de exploração, sem a expulsão dos camponeses
de suas terras e com pequena mas decisiva presença do poder metropolitano. A
Nigéria e o Gana foram exemplos típicos de administração indireta inglesa, o
que facilitou a manutenção do peso político das velhas classes dominantes
fundiárias e mercantis.
Há urna acentuada desigualdade entre as regiões tropicais e as
do Sael. Os países do interior continuam subsidiários dos litorâneos, para onde,
aliás, enviam emigrantes. Excetuando a Nigéria, maior produtor africano de
petróleo, a região conta com pouca produção mineral, embora os diamantes de
Serra Leoa tenham tido influência nos recentes conflitos da região.
No aspecto sociocultural, nota-se ainda o peso político dos
herdeiros das velhas classes mercantis oriundas do tempo da intermediação do
tráfico de escravos. Sentese ainda a presença política das sociedades crioulas
fortalecidas, sobretudo no século XIX, como em Cabo Verde, Serra Leoa, Senegal,
Libéria e Guiné-Bissau. Há presença marcante do islamismo, majoritário em
alguns países. Elites cristãs estão no litoral.
África
Central
Esta classificação inclui dez países:
Burundi, Camarões, República Centro Africana, Chade, Congo (Brazzaville),
República Democrática do Congo (ex-Zaire), Gabão, Guiné-Equatorial, Ruanda e
São Tomé e Príncipe (Burundi e Ruanda são, frequentemente, considerados como
parte da África Oriental; prevalece aqui o caráter geopolítico e a integração
regional).
Do ponto de vista histórico, o reino do Congo e seus vizinhos
vassalos constituíram a mais famosa entidade política pré-colonial da região,
tendo iniciado as suas relações com os portugueses em 1482. Esse reino abrangia
o sul do atual Congo, o sudoeste do Congo-Zaire e o noroeste de Angola. O reino
sofreu, décadas após o contato com os portugueses, uma forte desestruturação
com o tráfico escravo. A colonização envolveu cinco potências europeias. 0
Congo-Zaire, R.D.C., foi colonizado pela Bélgica, depois de ter sido, por quase
duas décadas, uma colônia pessoal do soberano belga Leopoldo I. A
Guiné-Equatorial foi a única colônia espanhola na África Subsaariana. Os quatro
países restantes integraram a África Equatorial
Francesa (A.E.F.), com capital em Brazzaville (atual Congo). O
Camarões foi colônia alemã até a Primeira Guerra Mundial, sendo depois entregue
à tutela da França e da Inglaterra pela Liga das Nações. A colonização foi
particularmente predatória, sobretudo na sua primeira fase, marcada pela
exploração do marfim e da borracha. A província de Katanga (Shaba) teve um
povoamento de cerca de 100 mil europeus, devido à exploração do cobre,
diamantes e outros minerais.
A região, além dos minérios referidos, é rica em petróleo
(Congo, Gabão e Camarões), além de urânio e manganês. Situada na sua maior
parte na zona equatorial, apresenta fraca densidade demográfica. No campo das
relações internacionais, o Congo-Zaire, apesar da fraca integração nacional –
vive há décadas em situação de crise –, é o país com maior importância geopolítica
da região, além de ser o de maior extensão e o mais populoso. O Camarões é o de
maior PIB, graças à exploração de petróleo a partir da década de 1980.
África
Oriental
Voltada para o Oceano índico, com duradouras relações com o
mundo árabe e o subcontinente indiano, esta região não apresenta no seu todo, a
relativa homogeneidade das demais. Destacam-se nela duas sub-regiões: a
norte-oriental, conhecida como o Chifre da África, e a centro-oriental.
O Chifre da África é formado por Etiópia, Eritréia (independente
da Etiópia em 1993), Djibuti (ex-colônia francesa) e Somália, que foi
colonizada, em partes separadas, pela Itália e pela Inglaterra. O Sudão, aqui
incluído, poderia ser considerado como pertencente à região da África do Norte,
como "retaguarda" do Egito, que o administrou no tempo colonial
(condomínio anglo-egípcio) e com o qual forma uma sub-região, a nilótica.
Contudo, uma forte comunidade negra, cristã ou animista, no sul, faz que ele se
diferencie bastante da homogênea África do Norte.
Embora muito menor que no tempo da Guerra Fria, a região ainda
guarda uma apreciável importância estratégica, devido ao petróleo e à sua
proximidade com o Oriente Médio.
A Etiópia é o país mais importante do Chifre, embora a sua
decadência econômica não mais o inclua entre os quinze maiores PIB do
continente. Foi sede da OUA e continua sendo a da sua sucessora, a União
Africana. Tem o poder simbólico da sua história de Estado milenar. No século
XIX o império etíope, antiga Abissínia, expandiu-se às custas dos seus
vizinhos, hoje incorporados ao Estado. Nunca foi colônia de nenhuma potência,
embora sofresse uma ocupação militar italiana entre 1936 e 1941.
Sua população se divide praticamente apenas entre cristãos
ortodoxos e muçulmanos.
A África centro-oriental é formada pelas ex-colônias inglesas de
Uganda, Quênia e Tanzânia (antiga Tanganica e ilha de Zanzibar), que no período
colonial integravam a África Oriental Britânica.
Ela apresenta um lastro cultural marcado pelo cruzamento de
povos árabes e asiáticos (sobretudo do subcontinente indiano). É a área por
excelência da cultura suaíli, cuja língua já foi referida. Ela foi a língua
franca de penetração dos árabes para o tráfico de escravos que durou perto de
dez séculos, dirigiu-se predominantemente para a África do Norte e Oriente
Médio, é pouco estudado e ainda menos comentado pelos africanos - árabes ou
não.
No campo das relações internacionais, foi a primeira região do
continente a promover a integração econômica ainda na década de 1960, com a
criação do Mercado Comum da África Oriental, ou Kenutan, formado pelos três
países citados. A iniciativa foi frustrada, entre outras razões, pela ditadura
de Idi Amin no Uganda. Com o deslocamento político e econômico da Tanzânia para
a África Austral, o Quênia consolidou a sua posição de mais importante polo
econômico de toda a região.
Sem recursos minerais expressivos, como os restantes países da
região, o Quênia tem excelente agricultura, explora muito bem o turismo
ecológico e sua capital, Nairóbi, é sede mundial da Organização do Meio
Ambiente das Nações Unidas.
África
Austral
Tida como a região-chave do continente, a África Austral é bem
mais do que uma simples expressão geográfica. Ela apresenta pela peculiaridade
da sua precoce história colonial, uma alta taxa de integração regional, em
vários níveis, que não encontra paralelo em qualquer outra região do
continente.
Ela possui, também, um valor estratégico relacionado com a rota
do Cabo, que perdeu muito do seu interesse com o fim da Guerra Fria, mas que
ainda é de se considerar no âmbito do Atlântico Sul. Por essa rota continuam a
passar cerca de dois terços do petróleo que, proveniente do Oriente Médio,
abastece o Ocidente. Além do mais, a região contém um dos maiores acervos
minerais do mundo, alguns deles ainda estratégicos e indispensáveis à Europa e
aos Estados Unidos.
A região está situada entre os oceanos Atlântico e Índico. A
fachada atlântica lhe confere proximidade e boa potencialidade de cooperação
com o Cone Sul da América Latina. A fachada do Índico a coloca em contato com o
Oriente Médio e com importantes países asiáticos, que têm uma longa história de
comércio e influência mútua com a região.
A África Austral é composta por onze países: África do Sul,
Angola, Botsuana, Lesoto, Malavi, Moçambique, Namíbia, Suazilândia, Tanzânia,
Zâmbia e Zimbábue. Desses países, seis não têm saída para o mar (Botsuana,
Lesoto, Malavi, Suazilândia, Zâmbia e Zimbábue), o que é um fator a mais para
ensejar a integração. A configuração aqui expressa de África Austral não é
normalmente assim considerada na divisão geográfica tradicional do continente.
Ela vem se consolidando nas últimas décadas por razões geopolíticas e geoeconômicas.
Um exemplo: a Tanzânia é um país situado na África Oriental; contudo, por
razões políticas e econômicas, ela se "australizou" e hoje faz parte
de todos os organismos integrativos da região. Quanto a Angola e, em certa
medida, a Zâmbia, são países que, histórica e culturalmente, também pertencem à
África Central.
África do
Oceano Índico
Ilhas Comores, Maurício e Seichelles são habitadas por povos de
origens diversas - árabes, africanos, indianos e europeus - que deram origem a
culturas-sínteses, crioula, porém diferenciadas entre si. Ente elas, a de maior
êxito político e econômico e a República Maurícia, grande produtora de açúcar e
de confecções com alta tecnologia, a ponto de ser considerada pela ONU um
"novo país industrializado" da África, que se distingue também pela
estabilidade há mais de três décadas, de seu sistema multipartidário e
parlamentarista.
PERFIL HISTÓRICO
A África Austral é a região do continente com o mais antigo e o
maior processo de implantação de colonos europeus. Ele começou, em 1652, na
área da Cidade do Cabo, a partir da montagem de um pequeno entreposto pela
Companhia Holandesa das índias Orientais. Foi também a única colônia de
povoamento europeu criada antes da Revolução Industrial e da "corrida para
a África", desenrolada a partir da segunda metade do século XIX. Essa
circunstância histórica marcou definitivamente o caráter da região.
A integração da África Austral teve como primeiro protagonista a
Inglaterra. A região acabou se constituindo num subsistema do imperialismo
britânico. Embora o sonho de Cecil Rhodes, de uma ligação britânica
ininterrupta do Cabo ao Cairo, não tenha se concretizado, a Inglaterra foi se
assenhoreando gradualmente da região.
Primeiro, se apossou das colônias bôeres do Cabo e do Natal. Em
seguida, após a guerra anglo-bôer (1889-1902), de toda a União Sul-Africana.
Agregou à Coroa Britânica a Rodésia do Sul, atual Zimbábue, inicialmente
ocupada, sobretudo pelos bôeres; depois a Rodésia do Norte (hoje Zâmbia) e a
Niassalândia (atual Malavi). A Namíbia era uma colônia alemã (sudoeste
africano) que, após a derrota germânica na Primeira Grande Guerra, foi
entregue, como mandato, à África do Sul que ilegalmente a incorporou. A outra
colônia alemã, o Tanganica, foi entregue à Inglaterra, também como mandato, e
constitui hoje a Tanzânia.
Quanto a Angola e Moçambique, estavam como a sua metrópole,
Portugal, sob forte dependência econômica da Inglaterra. Os enclaves de
Botsuana, Lesoto e Suazilândia tornaram-se, nessa época de guerras entre
bôeres, zulus e ingleses, protetorados britânicos.
Numa linha de raciocínio simplificado, poderíamos dizer que,
desde o início, a África Austral teve um processo perverso de integração,
desenhado pela mão pesada de uma colonização de ocupação (ou de povoamento).
Esse processo foi economicamente detonado, um pouco antes do final do século
XIX, com a descoberta das grandes jazidas de diamante e ouro. Poucas décadas
depois, enriqueceriam ainda mais a região a exploração de ouro, cromo e cobre
das duas Rodésias e a dos diamantes de Angola e Namíbia.
O esquema da integração pode ser resumido da seguinte forma: as
grandes fontes de minerais iam sendo descobertas no hinterland - incluindo aí o
cobre do Congo-Zaire - e se ligavam, principalmente, aos portos de
Lobito-Benguela (Angola), Maputo e Beira (Moçambique), os terminais mais
importantes (além dos da África do Sul) de uma complexa rede ferroviária que ia
do Atlântico ao Índico, montada pelos britânicos. Este era o esquema básico da
integração econômica nos seus primeiros tempos.
A integração se amplia após a Segunda Guerra Mundial e toma
novas formas políticas depois da vaga nacionalista africana dos anos 60 e 70.
No campo político, começa a tomar forma o pacto de alianças do chamado
"poder branco", ou seja, os governos da África do Sul, da Rodésia sob
o domínio da minoria branca e o governo colonialista de Portugal - formou-se o
eixo Pretória- Salisbury-Lisboa.
Na esfera econômica, os principais atores são as multinacionais,
a maior parte de origem sul-africana e britânica, que atuam articuladamente em
vários países da região, dominando cada um dos setores específicos da produção
e da comercialização. 0 exemplo mais expressivo é o da holding sul-africana
Anglo-American Col., que tem como principal subsidiária a De Beers - a maior
distribuidora mundial de diamantes. Este holding atua em todos os países
austrais Por intermédio de dezesseis minas de ouro, dezessete de carvão, cinco
de cobre, além de 31 companhias de financiamento.
Essa integração "perversa" aqui exposta passou a ser
questionada, sobretudo em nível político, após a independência de Moçambique e
Angola, em 1975. Estes países somaram os seus esforços aos da Tanzânia, Zâmbia
e Botsuana para, no quadro da Organização de Unidade Africana (OUA),
intensificar a ajuda aos movimentos de libertação do Zimbábue, da Namíbia e da
África do Sul. Esse grupo de cinco países passou a ser chamado de Países da
Linha de Frente (FLS, em inglês). A independência do Zimbábue, em 1980,
reforçou o grupo na luta pela independência da Namíbia, que viria a ocorrer em
1990.
No campo econômico, os seis países da Linha de Frente,
juntamente com os vizinhos Lesoto, Malavi e Suazilândia, criaram, em 1980, a
Conferência para a Coordenação do Desenvolvimento da África Austral (a SADCC -
Southern African Development Coordination Conference. O principal objetivo era
o de diminuir a dependência econômica da África do Sul.
UNIDADE E DIVERSIDADE
Além da altíssima concentração de minerais nobres e da
singularidade da sua integração, há muitos outros fatores que tornam a África
Austral notável dos pontos de vista econômico e geopolítico. Um desses fatores
é a posse, para padrões africanos, de um grau razoável de identidade
étnico-cultural e, ao mesmo tempo, apresentar neste mesmo campo uma diversidade
inédita no continente.
Privilegiando primeiro os indicadores de unidade e operando frequentemente
com estimativas, podemos dizer que, do ponto de vista étnico-linguístico, a
região tem, na sua grande maioria, base linguística banto. Em quase todos os
países, três ou quatro línguas africanas costumam abranger cerca de 70% do
total da população.
Dos onze países da África Austral, nove têm o inglês como a
única ou uma das línguas oficiais. Os outros dois são Angola e Moçambique, de
língua portuguesa. Esta é também falada por cerca de 400 mil portugueses
residentes na África do Sul.
A religião cristã é predominante na região. Na África do Sul, os
cristãos constituem cerca de 70% da população. Em Angola, mais de metade da população
é cristã, predominando o catolicismo.
Examinando agora o lado da diversidade étnica e o que ela tem de
potencialmente enriquecedora no pós-apartheid, notamos que a África Austral
possui um contingente de população de origem europeia (brancos africanos e
estrangeiros residentes) que ultrapassa os 5,5 milhões de pessoas - pouco mais
de 5 milhões na África do Sul. Esse número de brancos é largamente superior à
soma dos existentes em todas as demais regiões do continente e, por herança do
colonialismo, é provido de maior renda e melhor formação profissional do que a
média da população restante.
Os países da região, com elevado destaque para a África do Sul,
têm 2,4% (mais de um milhão) de originários da Ásia (da antiga Índia, hoje
União Indiana, Paquistão e Bangladesh). O percentual de mestiços – presentes,
de modo desigual, na maior parte dos países - corresponde a pouco mais de 10%
da população total.
CONFLITOS E NEGOCIAÇÕES
A partir do início da década de 1960, a África Austral passou a
ser palco de lutas de libertação e rebeliões contra o apartheid. A
independência de Angola, em novembro de 1975, internacionalizou os conflitos e
transformou a região em palco da Guerra Fria. Essa internacionalização, com
Estados Unidos e União Soviética apoiando militarmente os seus aliados na luta
intestina em Angola, teve como principal detonador a invasão de tropas
sul-africanas em Angola, provocando intervenção cubana em favor do governo do
MPLA. Uma explicação mais satisfatória não cabe neste resumo. É, porém
indispensável ter uma visão geral desses conflitos que se desenrolam entre 1975
e 1989 - com o início do desmantelamento do apartheid e o fim da Guerra Fria.
A primeira das três fases dos conflitos vai até 1980, com
invasões sul-africanas em Angola e desestabilização econômica provocada por
Pretória em quase toda a região. O regime do apartheid defrontou-se
internamente com uma deterioração política e econômica - a rebelião de Soweto,
aumento das greves, queda do preço do ouro e sanções internacionais.
Pretória, sentindo-se vítima de total owslaught (assalto total),
respondeu com uma "estratégia nacional total", que resultou em maior
centralização do poder e militarização do país. O governo ainda tentou formar
uma "constelação de Estados" com os países mais dependentes da
região, mas fracassou. A independência do Zimbábue, também radicalizada pela
situação na região, pôs fim à chamada política "da cenoura e do
cacete".
A segunda fase, que se estende até 1984, é marcada por uma
polarização ainda maior dos conflitos. Os antes referidos Países da Linha de
Frente, fortalecidos com a independência do Zimbábue, ajudam a intensificar a
luta contra o apartheid e com a independência da Namíbia e criam a SADCC.
Pretória intensifica a desestabilização invadindo varias vezes o sul de Angola,
que faz fronteira com a Namíbia.
A terceira fase se inicia em 1984 com as negociações que
Pretória estabeleceu com Moçambique e com Angola, mas que foram frustradas
pouco depois. Contudo, à medida que aumentava o clima de détente entre as duas
superpotências e que o curso da guerra se tornava contrário aos interesses
sul-africanos, o governo de Pretória, após a batalha de Cuito Canavale opondo
diretamente angolanos e cubanos contra os rebeldes da Unita e tropas
sul-africanas -, reconhece ter perdido a hegemonia aérea na região e toma o
rumo das negociações. Estas desembocaram nos Acordos de Nova lorque, de
dezembro de 1988, dos quais se originou a retirada sul-africana e cubana de
Angola e a independência da Namíbia em 1990.
A DEMOCRATIZAÇÃO DO PROCESSO
Embora constituindo, como vimos atrás, uma zona de intensos,
imbricados e duradouros conflitos, a África Austral, após complexos acordos de
paz, acabou se destacando no continente como a região que mais tem promovido a
democracia, pondo fim ao monopartidarismo aí reinante em vários países.
O processo de maior impacto foi, sem dúvida, o desmantelamento jurídico
do apartheid e a realização em 1994 das primeiras eleições livres e gerais,
através das quais o eleitorado deu a vitória ao ANC e Nelson Mandela assumiu o
poder. Quatro anos mais tarde, novas eleições foram também vencidas por ampla
margem pelo ANC, quando assumiu a presidência da República o sucessor de
Mandela, T. Mbeki.
O processo já se iniciara com as eleições na Namíbia, em 1990,
por ocasião da independência, tendo a SWAPO sido vencedora e seu líder S.
Nujoma eleito presidente. Ele será reeleito nas duas eleições seguintes, em
1994 e 1998. Na Zâmbia, as eleições de 1991 foram vencidas pela oposição a K.
Kaunda que, apesar de "fundador da nação", cedeu o lugar de
presidente a F. Chiluba, reeleito em 1997. Outra vitória da oposição ocorreu no
Malavi, em 1994. O presidente H. Banda, no poder há mais de trinta anos e
considerado presidente vitalício desde 1991, é derrotado por B. Muluzi. No
Zimbábue, o presidente R. Mugabe, da Frente Popular, é eleito em 1990 e
reeleito em 1994.
Um país merece destaque na sua trajetória democrática - é o
Botsuana. Além de excelente desempenho econômico, ele mantém a tradição
democrática que se firmou desde a independência, em 1966.
Quanto a Angola e Moçambique, a adoção da democracia
multipartidária veio na sequência de acordos de paz dos governos com forças
rebeldes. Ambos só ocorreram após o fim do
apartheid e dos conflitos que o
regime de Pretória apoiava e municiava nesses dois países. Numa curta síntese
temos, para Angola, um acordo de paz de Bicesse entre governo e Unita, em maio
de 1991. Seguiu-se em final de setembro de 1992 a realização de eleições gerais
- tidas pelos observadores da ONU como livres e justas - que deram a vitória ao
MPLA e ao seu presidente J. Eduardo dos Santos. A Unita não aceitou os
resultados e iniciou uma nova guerra civil tremendamente destrutiva. Com a
intervenção da ONU foi estabelecido um acordo de paz em Lusaca, em 1994, a que
a Unita não obedeceu, sofrendo sanções das Nações Unidas, mas recorrendo à
venda clandestina de diamantes, o que lhe tem permitido resistir, ainda que em
grau reduzido, às últimas ofensivas de Luanda; entretanto, com o apoio de
vários partidos, inclusive de dissidentes da Unita, formou-se um governo de reconstrução
e de unidade nacional.
O processo moçambicano, com um contexto internacional bem mais
favorável, iniciou-se pela intermediação de uma congregação católica que
redundou num acordo de paz, assinado em Roma em outubro de 1992, entre o
governo e os rebeldes da Renamo. Foram realizadas eleições gerais em 1994 com
vitória da Frelimo e do presidente Chissano, que foi reeleito em 2000.
Muito bom!! Ajudou muito no meu trabalho de história da África, muito obrigada..
ResponderExcluirFico feliz. Por nada ^^
ExcluirIsso tá errado pois a África só tem 5 macrorregiões.
ResponderExcluir